domingo, 21 de agosto de 2016

OITENTA E UMA VÊNIAS PARA MESTRE LUIZ CHICO


OITENTA E UMA VÊNIAS PARA MESTRE LUIZ CHICO

“Nas horas de Deus amém. É pade, filho, ‘Sprito Santo. São as primeira cantiga, que nesse auitório eu canto.
Sai o Só e sai a Lua, sai as Istrela também, saiu essas Primavera, nas horas de Deus amém...”

Em 20 de agosto de 1935 nascia Luiz Chico na comunidade de Matas, distrito de Ceará-Mirim.

Muito pequeno andava entre as ribeiras do Rio Ceará-Mirim e os terreiros dos engenhos de açúcar, que povoavam todo o vale, acompanhando os folguedos de Boi de Reis, Pastoril, Lapinha e Congo. Era um divertimento ver e ouvir as loas de Birico e Mateus, as vênias do Boi, principalmente, na morte e repartição do animal, quando o Birico, Mateus e a Catirina, faziam a divisão: “o figo do boi, simamué, esse é de nois dois, simamué...e o coração, é pra mané João...e a passarinha, pra dona Guidinha...

Assim, quando engrossou o pescoço, entrou para brincar de daminha no rabo do cordão...evoluiu e chegou a brincar de Mateus.
A história do Boi-de-reis em Ceará-Mirim, provavelmente, se inicia com o desenvolvimento da economia canavieira, pois, há relatos de grupos existentes nos velhos engenhos primitivos.

O folguedo existente no distrito de Matas é remanescente de antigos grupos que existiam na ribeira do rio Ceará-Mirim entre as comunidades de Capela, Matas e Mineiros. Ele surgiu no início dos anos 1950 com a chegada de um taipuense que fazia a figura do Mateus e montou o grupo cujo primeiro Mestre chamava-se Zé de Rosa.

A partir de 17 de maio de 1957, com a saída do Mateus, o senhor Luis Chico assume o grupo e, também, a figura do Mateus, passando a liderar seus marujos até os dias atuais. Durante esses 59 anos o folguedo tem enfrentado as mais variadas dificuldades, desde a morte dos velhos marujos até a desvalorização do brinquedo pela sociedade e, principalmente, pelo poder público que não viabiliza oportunidades para a sua preservação.

Apesar de todas as dificuldades o Mestre Luís Chico tem sido um verdadeiro Herói na condução de uma tradição tão importante para a história e cultura de nosso município.
O Boi-de-reis é formado por personagens humanos, animais e seres fantásticos. Os humanos são o Mateus, O Birico, Nanã, os Galantes e as Damas. Atualmente os animais são a Burrinha e o Boi e representando os seres fantásticos, o Jaraguá.

Atualmente o folguedo tem sofrido muitas transformações, principalmente no que diz respeito às figuras, pois já não existe tempo suficiente para suas apresentações.  As encenações que havia durante o evento, também, foram abolidas, pois a duração fica em torno de vinte a trinta minutos, o que impossibilita desenvolvê-las plenamente, principalmente a moagem do engenho e a matança e ressurreição do boi.

A representação do boi, atualmente, limita-se a danças e cantigas, como as cantigas de abertura, compreendendo saudações e louvações aos “donos da casa”, ao Messias, pelo seu nascimento e aos Santos Reis; loas declamadas pelo mestre e pelo trio de cômico, Mateus, Birico e Nanã; apresentação das figuras da Burrinha,  Jaraguá e o Boi e as cantigas de despedidas.

Os enfeitados do boi são o mestre, as Damas e os Galantes. Eles se apresentam festivamente vestidos, cantam velhas cantigas religiosas, louvações e saudações, além de tradicionais baianos. O Mestre é o responsável pela brincadeira, é a pessoa que contrata as apresentações e convoca os componentes do grupo para os ensaios.
Os Galantes, em número de quatro, vestem-se de maneira idêntica ao Mestre. Durante a representação, dispõe-se em duas alas ou cordões e realizam evoluções, cruzamentos, meias-luas, etc. As Damas, em número de duas, são meninos de dez a doze anos, travestidos de mulher.
A figura principal do folguedo é o Boi. É o último que se apresenta. Depois que ele sai de cena, cantam-se as despedidas.

Minha história com o Mestre vem desde 2000 quando o encontrei pela primeira vez. Foi mais um pai, irmão ou filho que ganhei. O amor que tem pela sua arte me cativou e, desde então, mantivemos uma relação fraternal sincera e, com ele, aprendi a amar o simples, o popular, as tradições de raiz, a valorizar a sabedoria do povo, seus causos, suas crenças, suas histórias de vida. Aprendi que ser grande, é ser natural, simples, porém, verdadeiro!

Sempre que posso, passo um dia de prosa com o mestre, ouvindo e gravando suas histórias, suas músicas, as loas, os versos...esses dias são alimentos para minha alma e, apesar da indiferença e discriminação pelo popular, nos sentimos importantes porque, nos finalmentes, nós, os populares, somos especiais, não importa o quanto os outros pensem!!

Um dia a história será testemunha de que valeu a pena lutar pela preservação, valorização, fortalecimento e reconhecimento das tradições populares e, nossos mestres, Tião Oleiro, Luiz Chico, Manoel Gomes, José Rodrigues, José Baracho, Maria do Carmo, Severino Roberto, Belchior, as rendeiras de Jacumã, e tantos outros, serão os verdadeiros heróis dessa luta!!

Como diz o velho Tapuio:

“Não chores, meu filho, não chores, que a vida é luta renhida: Viver é lutar. A vida é combate, que os fracos abate, que os fortes, os bravos só pode exaltar.
...Um dia vivemos! O homem que é forte não teme da morte; Só teme fugir; No arco que entesa tem certa uma presa, quer seja tapuia, Condor ou tapir.
...As armas ensaia, penetra na vida: Pesada ou querida, viver é lutar. Se o duro combate os fracos abate, aos fortes, aos bravos, só pode exaltar.”


VIVA MESTRE LUIZ CHICO!!!

Nenhum comentário:

Postar um comentário